O primeiro ano, há 20 anos

O primeiro ano, há 20 anos


No final de 2003 a Revista Praia Vermelha publicava seu nono número, oferecendo um balanço do primeiro ano do primeiro mandato do governo Lula. Reproduzimos abaixo a primeira parte da apresentação da edição, editada por Myriam Lins de Barros e Ivo Lesbaupin, como um convite à leitura destes artigos temáticos que constituem notável fonte documental para a compreensão do país – e um retrato da correlação de forças entre suas classes sociais naquele momento. Com vocês, o primeiro ano, há 20 anos…

Este número dedica-se a fazer um balanço do primeiro ano do governo Lula. Analisar uma conjuntura é uma empreitada arriscada para uma revista semestral, já que ela muda muito rapidamente. No entanto, visto que os traços fundamentais do governo estavam claramente esboçados nos primeiros meses, decidimos aceitar o desafio. O leitor poderá avaliar se o resultado valeu a pena. Os artigos foram escritos entre setembro e outubro de 2003.

Em seu artigo, Governo Lula: um balanço do primeiro ano, Ivo Lesbaupin analisa os principais feitos do primeiro ano do governo: a Reforma da Previdência, a reforma tributária, a política econômica e a (ausência de) política social, o Plano Plurianual de Ação (PPA). Discute o suposto caráter mais democrático do novo governo, evidenciando o seu viés autoritário. Depois de reconhecer a novidade de uma política externa ativa e mais independente, chama a atenção para o processo de desmonte do PT – do PT construído nos últimos 22 anos, comprometido com os trabalhadores, antineoliberal, crítico do FMI e do Banco Mundial – e para o risco de sua progressiva transformação em um partido eleitoreiro, fisiológico, com apenas um projeto de poder. Termina alertando para o risco de desilusão popular quanto à política e conclamando à pressão sobre o governo para ser fiel a suas promessas.

O artigo de Reinaldo Gonçalves, Lula: aposta perdida, analisa a politica econômica do governo Lula. Considera que a escolha política de não alterar a direção seguida pelo governo anterior levará o uma maior vulnerabilidade e debilidade da economia brasileira, além de elevar a taxa de desemprego, já enorme. Depois de passar em revista o ajuste externo, a política externa e as reformas da Previdência e tributária, o autor se pergunta sobre as possíveis causas dos erros de Lula. Elenca cinco hipóteses que já foram levantadas, desde a teoria do “caos econômico” em que o país se encontrava, passando por possíveis acordos feitos durante a campanha eleitoral, até o orgulho e a autoconfiança do presidente. Conclui que “não há evidência de tendência sustentável de melhoria na economia brasileira. Muito pelo contrário”.

O artigo de Sônia Fleury, Novas bases para a retomada da seguridade social, se inicia com um breve histórico da proteção social no Brasil, desde o inicio do século XX até a Constituição Federal de 1988. Em seguida, apresenta o novo padrão inaugurado com essa Carta, o modelo de seguridade social, caracterizado pela universalidade da cobertura, pelo reconhecimento dos direitos sociais, pela afirmação do dever do Estado, numa perspectiva publicista e num arranjo descentralizado. No passo seguinte, mostra os elementos de contrarreforma que se foram desenvolvendo o partir da ótica fiscalista dos anos 90. Debruça-se, então, sobre a trajetória da assistência social, especialmente no governo FHC, mas tecendo também comentários sobre o período inicial do governo Lula. O artigo termina com digressões teórico-políticas sobre a questão social.

No dia 1º de outubro de 2003, César Benjamin proferiu a aula inaugural do segundo semestre da Pós-Graduação da Escola de Serviço Social do UFRJ. O artigo Economia brasileira e política econômica reproduz as ideias que ele desenvolveu nessa ocasião, fazendo um balanço da politica econômica do governo Lula. Depois de afirmar que o governo optou por legitimar e considerar intocável a herança recebida e que deu continuidade às chamadas “reformas estruturais” – com a privatização de bancos públicos e a reforma da Previdência-, o autor conclui que o governo Lula radicalizou a aplicação da mesma política macroeconômica do governo FHC. Escrito em setembro de 2003, o artigo prevê que “em termos de crescimento econômico, o ano já se perdeu”.

Encontramos em seguida a entrevista dada pelo professor Fabio Konder Comparato, publicada no jornal Brasil de Fato. Dado a sua relevância, decidimos reproduzi-la neste número.

E anexamos o documento A agenda interditada, iniciativa de um grupo de economistas, assinado por 293 Intelectuais e publicado em junho de 2003. […]

Número 9 na íntegra

Acesse agora a Revista Praia Vermelha n.9 (2003) com a íntegra da apresentação e dos artigos temáticos, além de artigos livres (de Elídio Alexandre Borges Marques e Sylvia Moretzsohn) e resenhas (por José Paulo Netto e João Marcelo Ehlert Maia).

Imagem: composição com a arte original de capa da Praia Vermelha n.9 e fotos das cerimônias de posse em 2003 e 2023.